Do nocaute à superfície

Você toma um soco numa briga. Brigas são rápidas, frações de segundo entre ser um covarde que não pensa ou um corajoso que age rápido. O preço de não agir é o retrogosto - adorei retrogosto - de uma covardia eterna, que te acusa de não ter tido atitude em um tempo oportuno.Todos os dias. Em suma, já fodeu tudo. No entanto, eu estou absolutamente crente de que em certos momentos, dá pra perder de lavada e sem defesa. Aí o retrogosto é gratuito, inevitável e independe da sua covardia. Ah...independe de qualquer coisa. Quem perdeu pra Deus sabe bem o que é isso. Não que seja essencial que aconteça; há pessoas que passam incólumes pelo desafio divino. O nocaute de Deus é a perda na essência. Não adianta, o jeito é engolir seco e baixar a cabeça, pianinho, pianinho... 

O que dá para se fazer é continuar andando pela calçada, respirar, tomar um ônibus e agredir desconhecidos - muito válido. Tudo isso já é muita coisa para quem escapa de um nocaute divino. Daí que vão te jogar aquela conversa de que "Deus sabe o que faz" "Escreve certo por linhas tortas." Deus e os acadêmicos vão encher o seu saco. Seja temente a eles. Não sei se serve para os outros, mas ando me agarrando ao cinismo. Sorrisão à la carte, uma garota simpática. Ah, o nocaute divino... O único para qual não existe cobertura, nem retaguarda, nem nada. Além do mais, há a incoerência  de sobreviver e ter de continuar vivo. Quem vai contar a história? Hum? Hein? Hein? Você. Quem vai engolir seco? Hum? O Sílvio Santos? Não... você! 

Aí um dia, você está assistindo ao programa da Regina Volpato, o tema da vez é: "Gosto de você, mas você bebe demais." Então surgem na tela aquelas histórias bizarras, de gente que apodrece viva e tudo o mais. Todas nocauteadas. E você ri, está rindo e naquele momento não lembra do pior momento da sua vida, que aconteceu há menos de um mês, depois de um telefonema em pleno domingo. E é nesse instante, que você percebe, que tomou a sua vida de volta. E de assalto.