9 de fev. de 2012

Nem molares nem pré-molares - uma história triste da Bahia

A Bahia é violenta. Demais. Há tempos acompanho sites de notícias do interior desse estado, o crack se alastrou junto com a facções daqui do Rio de Janeiro e ano passado o governo baiano lançou até o baralho do crime. O polo de Camaçari, ampliado por Antônio Carlos Magalhães, é envolto por gravíssimos problemas sociais que resultam em muito conflito como todo lugar que recebe industrialização. Por motivos aleatórios, tenho "interesse" nesse ambiente do jornalismo policial baiano. Porém, nunca pensei que tão perto de mim poderia haver uma história como a do Rafael, leitor do meu blog há mais de cinco anos. O Rafael é cheio de histórias escatológicas dos lugares onde viveu na Bahia: antes Ilheus e, agora, Camaçari. Rafa foi agredido severamente há cerca de dois meses e ele conta tudo no texto abaixo.




Triste Bahia





Nem Molares, nem pré-molares

Por Rafael Coelho



Foram três semanas inteiras internado no hospital levando uma vida negligente e tediosa à espera de uma cirurgia bucomaxilocraniofacial.
Assim, fui brutalmente espancado e terrificado por um sujeito que eu eu prefiro chamar de lata de lixo fedorento transbordante de porcaria junto com seu acólito malvado e inimigo da tranquilidade, um chupista nojento que nada tem de respeitável.
Não tive a malicia de sacar as camadas mais profundas que envolve o coração humano, e como quem atrai encrenca com a própria respiração, me servir de alvo para maldade e fui arrassado por um sujeito cujo os hábitos fariam vomitar um porco.

Não vou agora me deter a detalhes, só atento ao fato de que - independente do peso dos corpos e da dimensão de minha ignorancia para perigos iminentes - fui aviltado de forma completamente vil e covarde: O biltre sem perder tempo em circunlóquios deferiu um uppercut de direita mais um uppercut de esquerda, de modo que o meu maxilar tombou por terra.
Depois tudo ficou por conta das pauladas...
Quando voltei a mim estava estirado numa cama de hospital e daí por diante me afundei cada vez mais.

Conheci maus dias, efetivamente. Os primeiros dias foram pavorosos, o meu rosto inchou de tal modo que ficou quadrado, assim como uma caixa de sapatos.
Senti dores de minuto a minuto, desde o nascer do sol até o ocaso. Além das dores, me sentia tão mão que muitas vezes tive vontade de morrer.

Em virtude dos meus fracassos minha alma se encontrou exasperada e afundada em autocomisseração total por vários dias a fio, me sentia mais um numero para o time daquelas pessoas tristes que deploram todas as coisas. Meu estado de depressão era de tal ordem que muitas vezes tive ganas de cortar a minha própria garganta. Havia as limitações, o medo de ir dormir, os pesadelos depois de pesadelos e a solidão. Qualquer coisa diminuta e aparentemente sem importancia me deixava colérico, tudo culpa dos meus nervos trepidantes que parecia saltar pela pele afora, o estado liquido dos alimentos engana mas não aplaca minha fome, ficar sem comer deixa meus nervos elevados até a ultima potência de tensão, tudo começa com uma chispa de irritação até se transformar em cólera pura e legitima. E eu, infelizmente, não sou o tipo de pessoa que se acalma contando até dez.


Ja me sentia familiarizado com o tédio, rosnava para quem quissesse escutar: MAIS UM MINUTO NESSE HOSPITAL E EU VIRO A PORRA DE ANACORETA!
E os minutos viraram dias e os dias semanas, era como se eu fosse uma fagulha de astro caída sobre a Terra e escondida em lugar inacessivel, era como ser forçado a uma estruturação de um espirito perfeito e inquebrantável. Seja lá como for, para um espirito como o meu, ao fim e ao cabo, descobri que podia suportar mais do que realmente posso.
Todos esses dias de reclusão absoluta me apresentou - emetindo sinais - o fundamento da verdade de forma curiosamente contraria: foi como se eu passasse do claro para o escuro.
Suponhamos que exista duas pistas: complicar-se com relacionamentos ou simplificar a vida se isolando socialmente? A resposta me veio a galope posto que foi essencial para minha recuperação que meus amigos me considerassem importante e me fizessem visitas e me trouxessem livros e drágeas de bálsamos contrabandiados.
 
Com o tempo fui aceitando minha condição, o que se podia fazer?
Convem dar descanço a alma e uma paz ao rosto que atue como elemento restaurador.
Mas os dias de reclusão não foram só "corpo são, mente sã", os dias foram obliquos também, porque ao mesmo passo que fui forçado a cultivar meu espirito a se dedicar a uma vida lícita e tranquila, não podia ignorar o implacável ódio que declaro aos meus algozes, esses iniquos de coração não quebraram apenas a minha carantonha, mas me privaram do Prazer, o que para uma alma epicurista como a minha é algo absolutamente imperdoável.
O ódio que eu sinto por esses vermes condenados ao extermínio é exposto tão abertamente que eu poderia segura-lo com as proprias mãos. Eu ambiciono a ruína deles!
(eles estão respondendo ao processo, etc)

No mais, estou tentando ficar longe das pessoas, estou até mesmo evitando de falar com elas. Não há uma emoção  indentificavel dentro de mim, a não ser possivelmente, o niilismo e uma indizivel sensação de que a violência permeia nossas vidas, de que somos parte integrantes e muitas vezes espectadores inocentes de uma sociedade onde bárbarie e civilização convivem lado a lado, de modo que o homem segue sendo o lobo do homem.
Enfim, que a sorte nos permita e ela me permitiu mais uma vez estar entre as estatisticas dos vivos.
O melhor é mesmo o menos mau.

2 comentários:

Anônimo disse...

Isso aí é mais verdade do que poesia. ass: Rafael.

Luis Fernando disse...

Estou quase desistindo. Não o fiz ainda porque me resta um fio de esperança de que um dia irei cultivar o resto dos meus dias a cuidar de roça e ordenhar vaca como a moça da foto no post embaixo, de preferência longe do Brasil.