The residents
Tive muitos empregos ruins. Comecei trabalhando em loja aos 18, depois fui trabalhar numa academia de ginástica cuja dona era louca e só sabia gritar;
"VAI LÁ AJEITA ESSE CABELO VAI MOSTRAR A ACADEMIA"
e lá ia eu sem instrução superior mas exímia leitora de undreground, mostrar as nossas bicicletas ergométricas. Depois vim para o Rio de Janeiro e meu irmão arrumou um esquema pra eu vender cursos de inglês. Era a maior roubada, os tais cursos: consistia em você ligar para as pessoas que nunca vira na vida e mandar uma historinha de que ela tinha uma bolsa de estudos para o idioma inglês e mais um papinho de que se ela não estudasse inglês seria para sempre um fracasso. Em tempo: essa ideia cola porque há tempos os consultores de RH metem nomes como "expertise" "networking" e demais blablablás na cabeça dos outros de modo que, a minha ligação vinha a calhar na preocupação dessa gente.
"Senhora eu sei que nunca nos vimos mas o Eduardo que trabalha com a senhora disse que era grande o seu interesse pelo idioma inglês então vamos marcar um encontro ..."
Subia morro, pegava trem, o importante era que eu voltasse com um cheque de alguém que nunca havia me visto e que nunca havia visto a escola. Como fazia as pessoas confiarem em mim? Eu cheguei a ser vendedora sênior - eles nem gostavam dessa palavra: VENDAS, mas era isso mesmo. Claro que não fiquei mais do que alguns meses nessa.
Tempos depois fiz uma rigorosa seleção para uma loja multinacional de cosméticos. Eram portugueses e foram com a minha cara não sei como, porque na dinâmica de grupo - que eu acho uma perda extremada de tempo - me comportei como uma fanfarrona quando achei que não tinha a menor chance. Me contrataram. O trabalho era atender a clientela endinheirada que podia comprar cremes de mais de cem reais. Havia também as velhas que queriam ser maquiadas, então eu levantava aquele monte de pele flácida do rosto delas e metia uma sombra azul, um blush rosa e bartom vermelho, elas ficavam parecendo uns exús mas eu dizia;
"Tá lindo."
E vendia horrores. Esse emprego foi divertido mas todos os dias eu levava duas horas pra ir e mais umas três pra voltar, nesse tempo eu pensava no quê poderia estar fazendo se não estivesse dentro de um ônibus. Então um dia, uma colega de trabalho disse
"Você deveria ser jornalista já que adora saber de tudo, principalmente das pessoas."
"Então posso estudar psicologia"
"Não, você só quer saber, não acho que queira ajudar"
Foi aí que entrei pra faculdade de jornalismo. Nunca gostei muito da faculdade, no entanto, o trabalho de repórter é incrível. Outro engodo e nem acredito que eu precise dizer, é em relação a cultura dos jornalistas: a maioria não lê mais do que precisa para o trabalho, ganham mal, se vestem mal e na maioria das vezes sugerem as mesmas pautas em uma linguagem extremamente lugar-comum. Penso que há uma grande subestimação da capacidade da população e por isso, esse looping de bobeiras e textos cheios de clichê. De resto, sim eu gosto da profissão.
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O trabalho que estou fazendo, pesquisa pro documentário Verão da Lata para um canal de TV paga, sem dúvida foi o trabalho mais incrível que poderia realizar e o que me salvou da maior depressão profissional da minha vida. No início do ano, fui chamada para assumir um cargo estadual. O ambiente era árido, o jornalista que contratou saiu logo depois e eu tive de conviver com gente que veio de uma big empresa de comunicação coorporativa. O comportamento desses jornalistas é padronizado, dizem que a empresa não tolera bagunça nas mesas, enfim, é o jornalismo dos coxinhas, eles parecem gente saída do Admirável Mundo Novo. Agora imaginem, só imaginem eu convivendo com gente assim. Só digo, sofri. Fui exonerada e agora, apesar da incerteza dos freelas, me sinto muito melhor.

6 comentários:
Também me meti nessa, dona Camila. Nessa onda de jornalista. Não sou formado, mas como acharam que escrevo bem, me deram uma oportunidade na redação de um site. Tô aqui, sem ver sentido no que estou fazendo, mas... Preciso sobreviver. Também acho o jornalismo uma profissão incrível, mas não combina muito comigo, pelo a parte de reportagem não, já que sou preguiçoso e envergonhado, às vezes.
(www.mifocronicas.blogspot.com)
nessa área o diploma é de fato dispensável, tem muito asno diplomado. :) aproveite a oportunidade e pensa nas pessoas que você pode atingir com seu trampo.
Encontrei seu blog procurando pelo nome que vi em uns vídeos no site de notícias do clicabrasília, ou seja de Brasília.
É vc mesmo???
Seguindo na trilha... Como posso me manter atualizado sobre a produção do documentário? beijos
gosto da forma despretensiosa como vc escreve no entanto,pra quem trabalha escrevendo (e finge que caga e anda pra isso),a virgula do no entanto está errada.
Oi Bruno, pois é, acontece, sempre que quiser apontar fica a vontade.
att,
Camilla
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